15 maio 2009

Sobre a corda bamba da vida...

Atravessou a rua. Distraída e despreocupada continuou andando. Sem direção, sem sonho, sem razão. Tinha os olhos vermelhos de quem chorou além da conta. O passo curto e calmo explicitava a pressa quase inexistente de chegar não sei onde.
Um par de fones de ouvido fluorescentes e um 'all star' com cadarço de fita complementavam seu jeito exótico de ser. A voz dócil e, paradoxalmente, hostil de Renato Russo compunha o fundo musical que instigava suas rebeldes reflexões. Não compreendia o mundo, as pessoas, o sistema, tampouco compreendia si própria. Um trecho machadiano oscilava entre suas desordenadas idéias... "Se só me faltassem os outros, vá; um homem consola-se mais ou menos das pessoas que perde; mas falto eu mesmo, e esta lacuna é tudo."
Ignorava assobios. Sorria para os conhecidos, observava de maneira vaga as vitrines das lojas, o movimento frenético de pessoas e automóveis que formavam o cenário urbano. Calorimetria, radioatividade, globalização, matrizes, números binomiais, seno, cosseno, tangente, Revolução Francesa... Dominava humanas, sabia algo de exatas. Pouco sabia de si.
Queria mudar o mundo. Odiava Hitler e seus funestos ideais. Simpatizava-se com o Comunismo. Admirava Gandhi e Che Guevara. Não se identificava com sua imagem refletida no espelho, não se via por trás daqueles olhos enluarados e oblíquos, perdia-se no intrínseco de si mesma.
Almejava voar; não como um avião, estimulado pelo motor, mas como um pássaro, instigado, exclusivamente, por sua própria natureza, que o faz livre.
Depois de inúmeros passos e algumas reflexões, voltou para casa. Debruçou-se em sua cama e, com os olhos colados no teto, se pôs a pensar na coesão de números e letras, idéias e sentimentos, ciência e fé. Decerto queria um mundo mais coeso...

11 maio 2009

Uma Louca Apaixonada ou Uma Apaixonada Louca ?

Às vezes faz bem sair de casa sem rumo, tendo o coração como guia e a mente como guarda-costas. Quando o primeiro dá instruções mais insanas que o normal, esta nos cerceia, moderadamente, de acatar às mesmas.
Faço isso com frequência e, com a mesma frequência, corro o risco de morrer atropelada, de modo que tanto meu desvairado coração quanto minha ludibriada mente têm um péssimo senso de direção.
Mas, ainda assim, eu gosto que eles me orientem. Fico sempre tão desnorteada diante da complexidade mundana, que evoco aos dois, mendigando um caminho ou uma mera palavra amiga, nos momentos em que a solidão de mim se apodera.
É tudo tão confuso, tão anormal... Chego ao ponto de me perder na metade perdida de mim, sentir saudade de um futuro sonhado nos meus recônditos sonhos pueris. Arrepender-me de tudo que me tolhei de fazer por medo de errar. Chorar lágrimas idênticas às do choro de ontem. Talvez sejam as mesmas que ressuscitaram...
Diante dessa minha, aparentemente, infindável crise existencial, busco auxílio nas artes, quando não nos amigos dignos de confiança, que amenizam os efeitos mais explícitos do meu colapso mental. Mas e quanto aos outros? Àqueles que adentram minh'alma e marcam meu âmago com perenes cicatrizes?
Julgo inexistir remédio para tais funestos delírios. Até que vejo você. Desse instante em diante rejeito qualquer medicamento que não seja o brilho intenso dos seus olhos, capaz de regozijar minha triste mente, envolta por enigmas que só você pode me ajudar a decifrar...

09 maio 2009

Mistérios da Amizade

Sentados à beira de um rio, cujo nome me falha à memória, Eduardo e Mônica dialogavam por intermédio de uma insaciável troca de olhares. Ele era o típico ‘play boy’, tinha olhos vivos, intrépidos, que cintilavam o olhar morto e sereno daquela jovem, de natureza crua e ao mesmo tempo rebuscada, que viera morar na cidade há alguns meses. A poluição urbana, dos mais irreverentes cunhos, havia deturpado aquela inocência bucólica que fazia dela a mais ingênua das criaturas.
Dú, o que é amizade?”
“Ahh Mônica, é um tipo de relacionamento, que ocorre entre pessoas que têm afinidades.”
E o que é afinidade?”
“É gostar das mesmas coisas, ter pontos de vista em comum...”
Uai, então por que é que você diz que a gente é amigo, sendo que eu sou diferente a beça de você?”
Porque apesar de vivermos em mundos antagônicos, a gente tem uma certa cumplicidade!”
Ihh, lá vem você com essas palavras capetosas!” (risos)
Eu digo cumplicidade porque você me entende, me aceita do meu jeito e vice-versa. A gente se respeita, é sincero um com o outro... Isso é ser amigo!
Huuum, entendi! Mas Dú, tem uma coisa que eu tô matutanu faiz tempo... Amigo também se beija?
Às vezes, quando a amizade é colorida...”
E eu que pensava que a tal da amizade não tinha cor ...!” – concluiu Mônica em meio a estridentes gargalhadas.